Trata-se do mesmo discurso de Romero Jucá, estancar a
Lava Jato, delimitar onde está e fazer um grande pacto, só que com um texto rebuscado
e mais elegante que o “tem-que-parar-essa-porra”-do-Jucá
Vivemos um momento crítico, onde dois grandes patrocinadores
do golpe-16 estão rachados, as Organizações Globo ainda sustentam apoio a república
de Curitiba, já o Estado de São Paulo chutou o balde com o Moro e seus
Dallagnóis na defesa de MiShell-Temer.
Segue abaixo a íntegra do editorial da Folha de São Paulo
neste 1º de junho de 2017:
Em meio a grave crise, a agenda nacional foi
contaminada pelo pressuposto de que o País só será salvo se a classe política
for desbaratada, como se fosse uma quadrilha. Isso não costuma dar boa coisa
O juiz federal Sérgio Moro defendeu as delações premiadas, dizendo
que, sem elas, “não teria sido possível descobrir os esquemas de corrupção no
Brasil”. Segundo o magistrado, “a ideia é usar um criminoso menor para chegar
ao maior, para pegar os grandes”. Quanto ao fato de os delatores terem sua pena
abrandada ou até ganharem a liberdade, Sérgio Moro afirmou que “é melhor você
ter um esquema de corrupção descoberto e algumas pessoas punidas do que ter
esse esquema de corrupção oculto para sempre”, ou seja, “é melhor ter alguém
condenado do que ninguém condenado”.
Trata-se de uma visão muito peculiar de justiça. Não se pode negar
que as delações premiadas foram importantes para puxar o fio da meada que levou
o País a conhecer o petrolão, maior esquema de corrupção da história nacional.
O problema é que, atualmente, a julgar pelo que chega ao conhecimento do
público, as múltiplas acusações feitas pelo Ministério Público contra figurões
do mundo político estão baseadas somente, ou principalmente, nas delações, sem
que venham acompanhadas de provas materiais suficientes para uma condenação.
Quando muito, há provas testemunhais, nem sempre inteiramente dignas de crédito
ou confiança.
Criou-se um ambiente em que as delações parecem bastar. Se é
assim, o objetivo não é fazer justiça, mas uma certa justiça. Aliás, ensinava o
juiz Oliver W. Holmes que juiz não faz justiça, aplica a lei. Há tempos ficou
claro que certos membros do Ministério Público têm a pretensão de purgar o
mundo político daqueles que consideram nocivos. Para esse fim, basta espalhar
por aí, por meio de vazamentos deliberados, que tal ou qual político foi citado
nesta ou naquela delação para que o destino do delatado esteja selado, muito
antes de qualquer tribunal pronunciar sua sentença.
Foi exatamente o que aconteceu no episódio envolvendo o presidente
Michel Temer. Em mais um vazamento de material em poder do Ministério Público,
chegou ao conhecimento dos brasileiros uma gravação feita pelo empresário
Joesley Batista com Temer na qual o presidente, segundo se informou, teria
avalizado a compra do silêncio do deputado cassado Eduardo Cunha. Quando a
íntegra da gravação foi finalmente liberada, dias depois, constatou-se que tal
exegese era, no mínimo, controvertida. Mas em todo o episódio prevaleceu a
interpretação feita pelo procurador-geral da República, Rodrigo Janot, para
quem o diálogo é expressão cabal de uma negociata – e isso bastou para Temer
ser visto por muitos como imprestável para permanecer no cargo de presidente.
Assim é a política, como bem sabem os vazadores.
Enquanto isso, o empresário Joesley Batista, por ter grampeado o
presidente da República para flagrá-lo em suposto ato de corrupção e por ter informado
ao Ministério Público que deu dinheiro para quase 2 mil políticos com o
objetivo de suborná-los, não passará um dia sequer na cadeia nem terá de usar
tornozeleira eletrônica. Poderá até morar nos Estados Unidos, para onde já
levou a maior parte de seus negócios. Isso, nos termos do escandaloso acordo de
delação endossado pelo sr. Janot.
Se é verdade, como diz o juiz Sérgio Moro, que o objetivo dos
paladinos do Ministério Público é “pegar os grandes” criminosos, como explicar
que alguém que confessa crimes dessa magnitude, como fez Joesley Batista, não
será punido? A resposta é muito simples: o objetivo não é pegar os grandes
criminosos, mas apenas aqueles que, na visão dos procuradores da República,
devem ser alijados da vida nacional – isto é, os políticos. Ainda que nenhuma
prova apareça para corroborar as acusações, o estrago já estará feito. E, no
entanto, há muitos políticos honestos neste país.
Assim, as delações se tornaram instrumentos eminentemente
políticos. Na patética articulação em curso para encontrar um “substituto” para
Temer caso o presidente caia, a primeira qualificação exigida é que o nome do
candidato não tenha sido sussurrado por nenhum delator. Só então será
considerada sua capacidade de governar o País. Essa é a prova de que a agenda
nacional, em meio a uma das mais graves crises da história, foi definitivamente
contaminada pelo pressuposto de que o Brasil só será salvo se a classe política
for desbaratada, como se fosse uma quadrilha. Isso não costuma dar boa coisa.
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